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Viver by the book é muitíssimo caro!

A sociedade encarregou-se de nos fornecer uma espécie de guião de vida. Foi vendido às pessoas da minha geração (nascidos na década de 1980) um certo de roteiro para a felicidade: Curso Superior, Emprego Estável, Aquisição de Casa Própria, Casamento, Filhos. Uma vida configurada em torno destes 5 eixos fundamentais.   Existem

A sociedade encarregou-se de nos fornecer uma espécie de guião de vida. Foi vendido às pessoas da minha geração (nascidos na década de 1980) um certo de roteiro para a felicidade: Curso Superior, Emprego Estável, Aquisição de Casa Própria, Casamento, Filhos. Uma vida configurada em torno destes 5 eixos fundamentais.

 

Existem muitas pessoas, talvez a maioria, que vive segundo esta ideia de forma acrítica. É assim porque…sim. Isso não é uma boa resposta. Aliás, não é resposta nenhuma. Muitas vezes são tomadas atitudes – por exemplo a manutenção num emprego chato e infeliz mas estável – ou o avanço para a decisão de tomar filhos porque “faz parte da vida”. Esta aceitação do guião é, por si só, potencialmente geradora de frustração em especial quando confrontados com outras experiências. Uma espécie de choque de realidade que por vezes nos assalta quando viajamos a um país com uma cultura muito diferente da nossa.

 

Por outro lado, existem os haters fanáticos dessa solução. Criticam quem segue esse estilo de vida porque seguir as regras é mau. Metam-se na sua vida. A única coisa que me parece que todos devemos propugnar é que devemos escolher um guião que nos faça verdadeiramente felizes.
Muitas pessoas a certa altura da sua vida ficam frustradas. E quase sempre atribuem a causa da sua infelicidade à…rotina. Mas o problema não me parece que seja verdadeiramente esse. É, inclusivamente, mais grave. É que a sociedade não nos disse apenas que devíamos viver by the book…disse que aqueles cinco eixos (curso, emprego, casa própria, casar e ter filhos) correspondiam a um padrão mínimo de normalidade que todas as pessoas deveriam aspirar. Aqui está o erro causador de muitas infelicidades.

 

É que ao acreditarem nisso as pessoas querem viver by the book mais outras coisas out of the book. Quer dizer: Querem ter casa própria mas arrendar uma segunda casa. Querem ter filhos mas ir viajar todos os anos. Mais que uma vez. Querem casar mas querem ter múltiplos parceiros. Querem um emprego estável mas querem um emprego divertido. Querem tudo. O melhor dos dois mundos. E isso não passa de uma doce ilusão. Pelo menos para a esmagadora maioria das pessoas.

 

A verdade é que o guião que nos foi passado não corresponde a um nível mínimo de satisfação. Na verdade viver by the book é…premium! É realmente muito caro. E, para a maioria das famílias corresponde a renunciar a outras coisas.
Para não ser (excessivamente) maçador centro-me em três dos cinco eixos: Emprego Estável, Casa e Filhos.
Abri um site de apostas e vi que se apostar um euro na vitória do Benfica contra o Arouca ganho 19 cêntimos. Mas se apostar um euro na vitória do Arouca ganho 14,50€. A diferença é abissal. Porquê? Porque existe uma relação sensível entre risco e lucro. Quanto menos arriscada for a aposta menos lucrativa será. Um emprego estável é isso. Nós temos de pagar um preço por ter um emprego muito estável. E esse preço significa muitas vezes uma de duas coisas (às vezes as duas): Baixa remuneração (pelo menos no valor/hora) e trabalho chato. Por isso, viver by the book no que respeita a ter um emprego estável significa perder algum dinheiro.

 

É uma opção muito cara. É premium. E as pessoas não percebem isso. Por exemplo, insurgem-se (mesmo que não o digam) com um pequeno empreendedor trabalhar metade das horas e receber o dobro dessas pessoas. Isso acontece porque o empreendedor arriscou. Risco leva a maior lucro. As pessoas acham que um emprego estável é o mínimo: A frustração começa não por terem um emprego estável (ou seja não pela escolha do roteiro pronto a vestir) mas porque queriam algo em cima dessa opção. Queriam estabilidade, estímulo e dinheiro. Isso é muito difícil. E num trabalho por conta de outrem é quase impossível. Aliás, a este respeito viver by the book – comprando casa e tendo filhos – significa uma renúncia a possibilidades de emprego desde logo no estrangeiro.

 

A questão da casa própria é paradigmática. Um tipo para pedir 200.000€ de empréstimo a um banco para conseguir uma casa que permita ter filhos vai ficar a pagar uma mensalidade bastante alta e durante uns bons quarenta anos. Isso significa uma opção: Optar por zonas menos boas, perder muito mais horas para chegar ao trabalho, ter que pegar no carro e fazer bastantes quilómetros para por exemplo ir ao cinema ou ir jantar a um restaurante giro em Lisboa. Para comprar casa numa zona melhor que fizesse face a essa vivência by the book seria preciso o dobro do dinheiro ou o dobro dos anos a pagar. Como não se tem o dobro do dinheiro aos 20 e tal anos e como não se vive aos 110 para poder duplicar as prestações o que acontece é que essa é a opção. Normalmente esse tipo de empréstimos correspondem a casas novas e espaçosas. E no final da vida, se tudo correr bem, a pessoa fica com o património. Isso tinha de ter um custo: A localização e a possibilidade de mobilidade. É um investimento que se faz. A frustração começa quando se perde 1h30 para se chegar ao trabalho num trânsito caótico. Quem me dera viver na cidade dizem alguns. Mas a opção não foi a outra?

 

O exemplo mais gritante serão os filhos. Existem vários estudo: Um protagonizado pela Liverpool Victoria Society refere 250.000€ de custos entre os 0 e os 21 anos. Vi um outro para comparar com países com custo de vida menor (Brasil) e fiz uma simulação introduzindo um conjunto de dados que permitiram chegar a um valor de quanto me custaria a mim ter um filho mas no Brasil (por isso com um custo de vida inferior). 157.465€. Vamos dizer que em Portugal, numa classe média, ter dois filhos, dos 0 aos 25 anos, terá um custo muito próximo dos 400.000€. Como tive a oportunidade de defender na dissertação de mestrado os filhos são de longe o maior investimento do casamento. Cá está mais um exemplo que viver by the book é muito caro! 400.000€ dá para cerca de 100 viagens à Islândia para duas pessoas. Dá para comprar um T3 em Lisboa a pronto. Dá para gerar um juro por mês que permitiria que alguém não trabalhasse. Dá para comprar 10 Mercedes Novos (senão forem muito caros).

 

O que importa é ser feliz. Independentemente do modelo. Mas não se queira, sempre, o melhor dos dois mundos!

tmgmendonca@gmail.com

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